 |
Super Drags, 2018, Netflix |
REVIEW: Super Drags ou American Pie Gay
“Super Drags” vem causando burburinhos desde que a Netflix
anunciou a animação brasileira no começo desse ano. Voltada para o público LGBTQ+,
a série que traz três Drag Queens como
super-heroínas teve que ter um cuidado extra em relação a sua classificação
indicativa. Recebendo várias ameaças de cancelamento em comentários de posts
sobre a série no Facebook, a Netflix teve que deixar claro que o programa se
tratava de uma animação adulta. Já no primeiro episódio nos deparamos com a
mensagem da personagem Vedete dizendo “esse desenho não é para criança”, mesmo
isso estando claro na classificação indicativa de 16 anos e nas palavras no
cartaz da série: “É só para adultos, querida”. Detentora de animações como
“Desencanto”, “Bojack Horseman”, “Paradise Police” e muitos outros, é
decepcionante ver que a produtora se viu na obrigação de dar esse “tratamento
especial” a Super Drags, não por ser um desenho adulto, mas sim por ser um
desenho sobre Drag Queens. Isso
reflete toda a ignorância (e preconceito) da sociedade quando se trata de
assuntos LGBTQ+.
Mesmo sendo desnecessário todo esse cuidado, Super Drags é,
de fato, muito pesado para crianças por conta do seu alto teor sexual (a
exemplo de “Family Guy”, “Big Mouth” e outras já citadas). Não seria um choque
se a série se chamasse “Diferentes Formas de Colocar Pênis em Qualquer Lugar”,
já que é isso que parece acontecer. Tem pinto na nuvem, no capturador da vilã,
no robô chamado “Dildo”, quase em tudo tem pênis, e não vamos nos esquecer das
bundas que também aparecem a todo o momento. Essa “forçação” de barra
transforma a série em um “American Pie Gay”, trazendo um humor pobre e
estereotipado, deixando a animação dependente desse tipo de humor obsoleto.
Essa sexualização exagerada traz o maior problema da série, a normalização de
um assédio sexual. Ao salvar o vilão que
jogou um ônibus cheio de pessoas no rio, uma das protagonistas, Lemon, se
aproveita da situação para pegar no pênis do rapaz que estava desacordado por
conta do acidente. Ainda que isso seja caracterizado como estupro de vulnerável,
os produtores não parecem se importar muito com a situação e não corrigem o
problema no decorrer da série, nem ao menos trazem um debate sobre o assunto.
Por outro lado, a série aborda temas muito importantes como
a “ditadura da beleza” e a “cura gay”. O encontro da heroína Lemon no episódio
dois aborda o preconceito que existe dentro da comunidade LGBTQ+. É fácil se
enxergar na situação em que a drag está. Um encontro com um babaca homofóbico
já faz parte do cotidiano dos gays que usam aplicativos como Tinder e Grindr. Homens gays que acham que a homofobia só existe por causa
dos afeminados, que tratam pessoas gordas como aberrações e que desprezam
lésbicas e transexuais. Apesar de a Lemon aceitar o seu corpo no final, o problema
é pouco explorado e é algo que deve voltar - caso tenha uma nova temporada - e
abrir uma discussão mais profunda. Já no episódio três temos como assunto a
cura gay. Nesse sentido, o campo de concentração para “correção” do
comportamento de gays é algo que consegue trazer um maior aprofundamento pra
série, mas ainda deixa a desejar.
A dublagem é um dos pontos positivos da série,
surpreendentemente Pabllo Vittar mandou muito bem como Goldiva. Silvetty
Montilla também arrasa como Vedete Champagne e as três protagonistas têm uma
dublagem “okay” com vozes já conhecidas e respeitadas nesse meio. Entretanto, o
roteiro é algo que incomoda, assim como em Desencanto, o uso exacerbado de memes
da internet e gírias gays faz com que a série perca um pouco de originalidade.
Claro que se era esperado muitas referências da internet, mas muito do humor da
série se concentra nisso e torna a animação com pouco conteúdo novo, muitas
vezes os memes só são jogados de forma aleatória, se transformando em algo
chato e sem graça. Seria muito mais válido inventar um novo bordão, do que usar
termos como “close” e “to preparada pra atacar”, que já estão saturados.
Outro aspecto legal da série foi ter usado como referência
desenhos como “Meninas Super-Poderosas” e “Três Espias Demais”. Essa nostalgia
traz conforto e familiaridade ao assistir a série. Faz o expectador lembrar-se
da infância e das manhãs prazerosas em que acordava cedo para ver Sam, Clover e
Alex sendo sugadas pela lata de lixo convocadas para mais uma missão e, também,
da Florzinha, Lindinha e Docinho salvando mais uma vez a cidade de Townsville. (Bons
tempos!) O padrão na personalidade das heroínas é algo clichê, mas que funciona
nesse tipo de animação. Lemon é a chefe, ou seja, a Florzinha da equipe.
Safira, a meiga, corresponde a Lindinha. Scarlet a grossa, Docinho. Por seu sucesso
ser uma incógnita, foi esperto apostar em uma fórmula que já deu certo.
 |
Super Drags, 2018, Netflix |
Com apenas 5 episódios entregues em sua primeira temporada,
Super Drags é algo que precisa arrumar muita coisa para se manter no ar. O
roteiro tem que ser mais original (e menos de um amontoado de cópias saturadas),
possibilitando que a própria serie crie novos memes a partir de sua
originalidade, pois, diga-se de passagem, virar meme é o novo auge de
popularidade atualmente. Se você quer que algo tenha sucesso, faça isso virar
meme. A história, embora traga um bom gancho no episódio final, precisa de mais
conteúdo e menos pinto e bunda. Por ser algo novo, é perdoável a primeira
temporada ter episódios mais leves e menos complexos. No entanto, caso seja
renovada, Super Drags terá que abandonar a zona de conforto e partir para o
ataque, pois querendo ou não, a sua existência (a partir de agora) é mais que
somente entretenimento, mas também um ato político no que se refere a direitos
ameaçados pelo novo governo brasileiro. Para muitos Super Drags perderá o
status de série e passará a ser mais uma forma de resistência.
Minhas Redes Sociais:
Comentários
Postar um comentário